Aula de 23. 11. 09
Por Rita Quaresma Ribeiro
As publicações periódicas estão sujeitas a alguns constrangimentos no que diz respeito à forma, uma vez que o seu tamanho terá de corresponder a um padrão. O conteúdo terá de ser adaptado a essa definição prévia. Em teoria, os outros tipos de publicação não têm este tipo de constrangimentos. Porém, nem sempre se passa deste modo. Isto porque o mercado impõe uma série de factores que vale a pena considerar na altura de escolher o formato (por exemplo, qual me permitirá gastar menos dinheiro na sua produção? O livro que gostávamos de fazer nem sempre é o livro que o mercado nos permite fazer). Esta situação leva a uma padronização de formatos, que explica o facto da maior parte dos livros terem uma aparência semelhante.
Em Portugal, temos a figura do revisor e a do editor. O revisor é o que se encontra mais próximo do texto. A sua função passa pela revisão de falhas concretas e o seu trabalho é fundamentalmente técnico.
O editor encontra-se numa posição mais afastada do texto. Interfere mais ao nível da estratégia, dando sugestões mais generalistas (pode, por exemplo, sugerir que um capítulo apareça no princípio e não no fim).
No contexto das publicações periódicas, destacam-se duas figuras:
- O copy desk, que recebe os textos e faz as observações necessárias para que correspondam ao formato desejado. Não tem autonomia para tomar decisões de cariz editorial.
- O editor, que tem a responsabilidade editorial final, cabendo-lhe a tomada de decisões.
Nas publicações periódicas, existem critérios específicos aos quais o editor tem de ter atenção: a informação mais importante deve ser colocada em primeiro lugar (lead), as opiniões devem ser evitadas…
Num texto publicado em livro, os problemas serão diferentes, ainda que com uma ou outra semelhança.
O publisher e o editor
Para estabelecer a diferença entre as funções de publisher e de editor precisamos de recorrer à língua inglesa, tendo em conta que o português não possui dois termos diferentes. Ao dizermos publisher, referimo-nos ao dono/ responsável máximo pela editora. O editor, por outro lado, pretende designar a pessoa que, no seio de uma editora, trabalha com um livro concreto, sendo responsável por ele (nesta relação, pode ter mais ou menos autonomia).
A função de editor pressupõe a construção do gosto. Esta construção só pode ser feita através de muita leitura. É importante experimentar diferentes estilos e autores, pois ajuda a distinguir o que simplesmente não gostamos do que é realmente mau, independentemente do gosto pessoal.
Experiência: Enumerar os últimos 10 livros que lemos.
Há uma dificuldade de enumeração quando já foram lidos muitos livros. À medida que vamos lendo e conhecendo mais e mais autores, há a tendência para o deslumbramento ser mais raro. Se não nos deslumbramos, mais dificilmente nos ficam na memória.
Exemplo que alia técnica, sensibilidade e experiência: Richard Zenith, editor do Livro do Desassossego de Bernardo Soares (Assírio & Alvim). Ao longo dos anos, trilhou um caminho que lhe trouxe um treino e um saber específico. Através desta experiência, adquiriu um conhecimento do universo pessoano que lhe permitiu organizar, com sucesso, os fragmentos que compõem a obra, conferindo-lhes uma disposição harmoniosa.
Edição crítica
Este tipo de edição implica sempre um texto que, por qualquer razão, é fixado de acordo com alguns critérios.
- Quando um poema tem várias versões, que critérios utilizo para decidir qual das versões usar? Como fixar o texto? Qual das versões deve ser escolhida? Porque devo escolher uma e não outra?
-A edição crítica pressupõe uma reflexão criteriosa do texto. Toda e qualquer edição implica trabalho, no entanto, este tipo específico vai exigir um esforço mais profundo, que requer tempo e minúcia.
- Está frequentemente associada às universidades. Isto porque estas instituições reúnem mais condições para financiar todo o processo que a edição crítica pressupõe. As editoras comerciais têm mais dificuldade em tornar possível este trabalho, pois não é compensatório. Mesmo que venha a publicá-las, uma editora comercial não tem nem a estrutura financeira, nem o tempo que é preciso dispensar, para investir na produção de edições críticas.
Sobre o trabalho de editing
O trabalho de editing pode ser o mais interessante de todo o processo editorial, pois o editor torna-se co-piloto do autor, uma vez que lhe cabe o papel de acompanhar e aconselhar. Deste modo, participa directamente no processo criativo da obra. Ao contrário do autor, o editor está «fora do texto» e, por essa razão, consegue mais facilmente ver as falhas, as repetições… Ele é a voz que possibilita o contraponto de ideias.
Em Portugal, o panorama editorial não permite que haja tanto tempo para dedicar a esta actividade como, por exemplo, nos Estados Unidos da América. Nos países anglo-saxónicos, a figura do editor é mais preponderante.
Uma dificuldade: Como fixar o texto de autores que utilizam «erros» como desvios criativos? Como fixar Lobo Antunes ou Saramago, por exemplo?
Dois casos:
- Caso Gordon Lish/ Raymond Carver
O editor Gordon Lish vem exigir o estatuto de autor de textos de Raymond Carver, após a morte deste último. Caso extremo em que o editor reclama a autoria do livro que edita.
- Caso Eça de Queiroz
O filho de Eça de Queiroz corrigiu a obra do pai, introduzindo modificações para que ficasse mais de acordo com os padrões da época (o que veio a resultar numa puritanização dos textos).
Luiz Fagundes Fernandes limpou a obra desses melhoramentos. As opiniões não são consensuais: há quem prefira a versão do filho, pois tem o trabalho de editing de que o formato original carecia (tinha omissões), tornando-o mais legível.
O que fazer numa situação destas? Permanecer fiel ao original? Ou legitimar a mudança pela legibilidade do texto?
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Há 14 anos
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